Sou Márcio Eu sou historiador, professor há 31 anos, trabalhei em escola pública e atualmente sou professor da UFC. Já tenha nascido em Teófilo Otoni, sempre morei em Teófilo Otoni, sou filho de Terezinha, Ela é descendente de imigrantes austro húngaro e meu pai, retirante baiano, Era um casal cheio de contradições e de divergências. Diferenças. Dessa abolição nasceu esse pensamento também meu, que eu acredito ser inquietante.
Eu me especializei nos meus, nos meus estudos, em relação a história regional. Eu acredito que no território que as relações de poder e os espaços de tensão e de tensões acontecem são vivenciados. Então eu me direcionei em relação a minha pesquisa toda aqui no território do Mucuri, especialmente Teófilo Otoni, mas tendo o foco, essas, essas relações e principalmente um discurso fora da história oficial, eu nasci num ambiente onde o Teófilo Benedito Otoni era o grande herói e a gente acabou com o tempo descortinando todo esse discurso dessa história oficial, trazendo um tal Benedito Otoni escravista, um Teófilo Benedito Otoni fora do discurso oficial e ao mesmo tempo aproveitando a oportunidade para que trouxesse também outros atores, atores que foram silenciados, atores e pessoas, e que estiveram aqui fazendo, construindo na história da região. Nós temos aqui a Bahia-Minas, a estrada de Ferro Bahia-Minas, que é um grande mito também, como Teófilo Benedito Otoni, construído a partir dessa visão de uma história oficial da Bahia-Minas bonita, mãezinha carinhosa, né? E a gente começou a trabalhar a partir de outra leitura de uma Bahia-Minas, resultado de uma sociedade que saía da escravidão e que os trabalhadores que aqui vieram, principalmente aqui na comunidade Margem da Linha, são trabalhadores que são filhos ou netos dessa população escravizada. A propósito, seria da gente assim, ao longo dessa dessa trajetória de trabalhar com esse outro lado dessa história, uma história que realmente é vivida e que se identifica com a população de Teófilo Otoni
Por ser filho de um pai comerciante em ascensão, o meu pai, ele começa como feirante e depois consegue ter um... E com isso eu vou estudar numa escola de elite aqui, que é a Escola São José e vivendo em situações de dificuldade. E isso tudo me mostrava uma outra face da sociedade de Teófilo Otoni, dessa burguesia... de estar com a burguesia contraditória, cheia de preconceito e de racismo.
E vivenciando essas duas, essas duas realidades. Meu pai tinha a mercearia e onde era o prostíbulo, a zona de prostituição aqui é Francisco Sá. E então essa desconstrução do mito. E aí acabou com minhas pesquisas, todas com uma posição política, a construção de qualquer mito como sendo uma leitura autoritária, antidemocrata, que impossibilita a população, de uma maneira geral, de ter um caráter mais participativo. Então, hoje trazer essa desconstrução do mito, que é o caso da Bahia Minas, que é o caso do imigrante alemão, o Teófilo Benedito Otoni no sentido regional, a figura do Tiradentes também como mito. Então, eu acho que desconstruir mitos, essas narrativas, qualquer que seja da esquerda à direita, é uma proposta de chamar a população para participação democrática. Então, eu acho que isso é o ponto de origem hoje, teoricamente é filosófica a projeção de um trabalho de pesquisa em que resgate a história popular, a história que é contada por quem foi silenciado aqui me coloca nessa proposta de uma visão mais iconoclasta.
O que chama a atenção é que esse não única talvez seja uma das poucas em que se dá vida a uma ferrovia, como os pesquisadores do Triângulo Mineiro do Sul de Minas. Todos eles veem a ferrovia como a ferrovia, como um meio de transporte que não dá a vida. Até que ponto que a própria empresa construiu esse ideário para tentar cooptar os trabalhadores da mãe carinhosa, da mãe protetora, mas não tem documento. É muita suposição.
O fim da Bahia-Minas é 66. Dos documentos que eu trabalhei também poucos falam em relação desse mito. Ao que parece, começa a ventilar alguma coisa com aquela matéria publicada pelo Fernando Brant no Cruzeiro. O Cruzeiro, à época, era uma revista de grande circulação nacional. Era uma revista, talvez fosse a maior. E aí ele, no princípio da década de 70, ele vem com a reportagem falando a respeito dessa situação aqui vivida. A partir dela que surge a música do Milton Nascimento. Ele fala que quando ele volta, porque depois de 66 os ferroviários são levados para os locais. Quando ele volta à Teófilo Otoni Na década de 80, que se via em relação a esse ferroviários, era uma visão muito negativa da Bahia-Minas. A pergunta que eu faço essa: Quando que surge essa memória? A partir de que processos dessa memória? Mas o fato é que essa memória é resgatada a partir de uma memória branca, a partir de um branqueamento da Bahia-Minas, inclusive a própria associação, ela nasce dentro dessa visão branqueada de uma Bahia-Minas que era boa para todo mundo, muito rica. O Sérgio Llano está fazendo uma tese de doutorado. Existem vários autores que trabalham porque a memória da Bahia-Minas, ela é múltipla.
Existe o fato nós estamos aqui agora. Como analisa esse fato? Ele dá múltiplas interpretações e múltiplas narrativas. E a Bahia-Minas foi fruto disso. A Bahia Minas é uma narrativa no ponto de partida dela, uma narrativa de branqueamento que aquela saudade, que tempo bom. Ela ganha um outro tipo, uma releitura Nos últimos cinco anos em que começa a se pensar a Bahia, Minas, principalmente o local onde a gente está aqui, que é o princípio da margem da linha que foi reconhecido em outubro do ano passado como remanescente de quilombo Margem da Linha. E aí é uma memória que já traz um outro tipo de formato a memória, que traz uma vivência de trabalhadores negros. A Bahia-Minas, ela é resultado de um decreto de 1880 e já começa em 1881 a assentar os primeiros trilhos. Quer dizer, ainda no período da escravidão. A gente tinha aqui pelo que eu levantei mais de duas dezenas de terreiros. A gente tinha aqui uma relação de solidariedade e de convivência, de ajuda mútua, típica dessas comunidades. Muito de um processo igualitário. E, ao mesmo tempo, a gente começa a perceber uma tensão também em relação a população branca, de Teófilo Otoni. Então, a década de 40 e 50, essas tensões começam a ficar cada vez mais explícita. Um lugar de branco que seria o centro e a região norte de Teófilo Otoni e essa região sul, no entorno da Bahia-Minas, uma região, um território negro, um território de manifestações ligadas a musicalidade negra, a religiosidade negra, a fala negra.
Um desses trabalhadores, Júlio Costa. E aí eu abro um parêntese muitos trabalhadores vêm dessa região do Sul de Minas mais especial do sul da Bahia, especialmente Helvécia. E a época era um grande território áureo de trabalhadores escravizados. Foi uma colônia de suíços que chegou a escravizar 2000 africanos e brasileiros. O que me passa pelas narrativas é de que a população branca se sentia aliviada, entendendo que acabar com a Bahia-Minas traria modernidade, traria esse branqueamento que sempre foi a realidade dessa sociedade Teófilotonense.
Tem aqui diversos clubes. O carnaval aqui na região era muito forte. Havia um clube aqui dos ferroviários que tinha diversas atividades como cinema, barbearia, mas era ao mesmo tempo uma situação muito contraditória, porque havia o discurso oficial de uma marginalização desse Bahia-Minas e ao mesmo tempo, dessa construção, que não era algo que a gente poderia dizer assim, de forma explícita, consciente e institucional, desse território negro.
Um policial mata um Bahia-Minas num desses conflitos, os ba Minas pegam esse rapaz morto, coloca dentro, coloca em cima de um caminhão e roda o som da cidade com esse rapaz morto em cima do caminhão e leva o corpo dele para prefeitura que é onde hoje a câmara municipal e o corpo fica lá estendido. E aí começam a briga entre policiais armados e minas armados e ali começa um tiroteio que vai durar três dias e só termina com a presença da polícia de Valadares aqui dão apoio porque a polícia ficou acuada. Esse evento trouxe três mortes. O discurso polícia não gosta de Bahia-Minas e Bahia-Minas não gosta de polícia
Houve por outro lado, em um também desses conflitos um policial morto. todos os Bahia-Minas da época, e hoje as narrativas falam foi fulano quem matou. Mas a polícia não conseguiu apurar porque ninguém falou quem matou esse policial É uma outra memória da Bahia-Minas.
Um papel importante de falar sobre Minas nesse... nesse cenário e tentar resgatar esse apagamento. Até que ponto que a gente vai silenciar diante disso? Os monumentos nossos, Manuel Esteves, Teófilo Otoni, Ana Amália, são todos de pessoas que escravizaram, que para quem a população negra teve lá seus avós, seus bisavós com trabalho, com a violência da escravidão. Então essa história ela precisa ser recontada, ela precisa ser revista e é preciso trazer, ter um voz e vez. É a partir dessa história resgatada, essa memória plena que a gente vai conseguir trazer aquilo que nós nunca tivemos aqui em Teófilo Otoni, que é uma sociedade democrática.
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